Há dois votos pelo reconhecimento do vínculo. Julgamento foi suspenso por pedido de vista.
Dois dos três ministros que compõem a 3ª turma do TST acreditam que deve ser reconhecido o vínculo de emprego entre motoristas e aplicativos de transporte, como Uber, 99 e Cabify.
O julgamento teve início em dezembro de 2020 e foi retomado nesta quarta-feira, 15. Até o momento, votaram o relator, ministro Maurício Godinho Delgado, pelo reconhecimento de vínculo, por acreditar que é clara a subordinação desses trabalhadores, e o ministro Alberto Bresciani, que acompanhou o voto.
Em seguida, o ministro Alexandre Agra Belmonte prorrogou a vista, e o julgamento foi novamente suspenso.
Considerando-se que já há maioria (2 votos), e que esta é a última sessão do ministro Bresciani, já que sua aposentadoria está marcada para o próximo dia 22, é muito provável que estejamos diante de novo precedente, no sentido do reconhecimento de vínculo.
Quando iniciado o julgamento, em 2020, o relator, ministro Maurício Delgado, votou no sentido de que há, sim, vínculo de emprego entre as partes. Retomado o julgamento nesta quarta, o presidente do colegiado, ministro Alberto Bresciani, adiantou que acompanharia o relator no processo, após destacar que as plataformas digitais modificam o panorama trabalhista. Ato contínuo, o relator explicou seu posicionamento.
Voto do relator
O ministro Maurício Godinho Delgado pontuou que o tema é relativamente novo, e que o Judiciário passou a tratá-lo há poucos anos, sendo o primeiro impacto – e essas decisões inúmeras representam primeiro impacto – a ideia de que se tratava de uma forma de conexão apenas.
Mas, para o ministro, o que se vê é uma empresa com controle sofisticado de seus trabalhadores.
“No caso, nós temos o que? Primeiro, uma pessoa humana, executando um serviço de transporte de pessoas. E, de outro lado, essa pessoa só consegue realizar esse serviço porque existe uma entidade empresarial gestora extremamente sofisticada, avançada, de caráter mundial, a qual consegue realizar um controle minucioso da prestação de serviço. Esse controle é mais preciso do que o previsto originalmente na CLT.”
Para ele, não há como retirar a incidência da ordem jurídica apenas por se tratar de modelo tecnológico.
Ele destacou que os motoristas de aplicativos são fiscalizados permanentemente através do algoritmo, “inclusive sua rota, o que está fazendo – porque sabemos também que existem nessas plataformas conexão com satélites – e todo esse procedimento está controlado”.
Além disso, pontuou que há uma segunda maneira de controle – que chamou de “inovação, brilhante” – que é o cliente podendo entrar em contato direto com a plataforma, imediatamente no momento da prestação de serviço.
“Controle maior do que esse não existe. Não havia antes. É um controle cotidiano, de várias fontes. O que me parece mais claro aqui é o elemento da subordinação. Nós temos vários filmes que mostram como vivemos uma sociedade do controle. É o controle digital. E esse trabalhador é profundamente subordinado, mas com algumas peculiaridades, porque é um trabalho externo.”
“Ele pode se desconectar? Pode, mas isso também não é estranho à CLT“, destacou o ministro. “O vendedor antigo que ia para o interior, com seu fusquinha, também se desconectava, e não deixava de ser empregado e trabalhador subordinado.”
O ministro destacou que o motorista fica horas significativas do dia ligado à plataforma, que é uma organizadora do sistema empresarial, uma empresa de organização de serviços por meios digitais. “Essa empresa não teria um único ganho se o serviço não fosse realizado. Então é um sistema empresarial bastante inteligente, admirável, mas que não escapa – ao contrário, sofistica – a subordinação.”
Ele destacou que um dos importantes fatores de controle é que a plataforma coloca os clientes em contato imediato para informações a respeito do serviço. “Por exemplo, na pandemia, ele digita imediatamente: ‘motorista sem máscara’. Quando tem qualquer atitude grosseira, o indivíduo vai digitar. Não temos no direito do trabalho controle tão intenso quanto esse.“
Sustentação oral
Afirmando preocupação com possível precedente a ser criado no julgamento de hoje, o advogado da Uber, Sólon Cunha, destacou que “a sentença e o acórdão mencionam claramente que o reclamante escolhia repouso, horário de trabalho, início e término e poderia ficar offline. Não houve delimitação de número de clientes, atendimento, horas de trabalho. A vontade do motorista era a que se impunha na relação desses autos.” Destacou, portanto, ausência absoluta de subordinação.
Disse, ainda, que há 1.452 decisões de casos da Uber negociando vínculo empregatício, e 200 acórdãos nos regionais pela improcedência do pedido. Pontuou o advogado que o próprio TST já afastou a possibilidade de reconhecimento de vínculo.
O caso
O debate foi suspenso por pedidos de vista dos ministros Alexandre Belmonte e Alberto Luiz Bresciani.
No caso em análise, o pedido de reconhecimento de vínculo de emprego entre o motorista e o aplicativo foi negado em 1ª e 2ª instâncias.
Em dezembro de 2020, o relator da ação afirmou que é a primeira vez que a 3ª turma entra no mérito de casos como esses. No tribunal, o tema já aportou na 5ª turma, a qual concluiu que não há vínculo.
Ao analisar a presente controvérsia, o relator, ministro Delgado, pontuou que todos os elementos que configuram o vínculo de emprego estão presentes na relação entre os motoristas e as empresas de aplicativo, sendo o mais importante a subordinação.
Para ele, essas empresas “exercem poder diretivo com muita eficiência”, determinando ordens objetivas a serem cumpridas pelos motoristas.
Os aplicativos, por sua vez, argumentam que os condutores têm liberdade para escolherem horários e locais de trabalho.
Processo: 100353-02.2017.5.01.0066
Fonte: Migalhas
Publicada em: 15/12/2021